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segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Estes dias chuvosos assombram-me. Obrigam-me a ficar em casa sentada num canto da sala a inalar o silêncio que transpira pela casa. Seria injusto afirmar que me sinto sozinha porque na verdade, enquanto alguém morar no nosso coração… jamais estaremos sozinhos.
Ouço os passos vindos da casa da minha mãe e consigo entender umas palavras soltas que se gritam lá em cima, mas sinto-me bem assim… no meu mundinho de recordações e de sonhos.
É estranho porque olho ao meu redor e recordo o tempo em que a minha sala, pequenina mas confortável, era um espaço amplo a cheirar a mofo, recheado de móveis e coisinhas velhas que não deitávamos fora… por pena.
Quando me juntei com o pai da Íris decidimos fazer obras e conseguimos transformar aquele espacinho num quarto, numa sala, numa cozinha e numa casa de banho. Sempre lhe chamei “casinha da Barbie” com o maior orgulho porque na realidade, a “nossa” casinha era pequenina e nunca permitia que as pessoas ficassem muito longe umas das outras.
Quando a “nossa” casinha deixou de ser um refúgio de família (porque na verdade… já não somos família) o rasto de escuridão atravessou a sala, os espaços deixaram de ser ocupados com tanta frequência e comecei a passar mais tempo em casa da minha mãe. A minha “casinha da Barbie” passava agora a ser grande demais para mim e para a Íris e confesso que a abandonei inconscientemente.
Hoje recorri ao meu sofá e liguei a televisão depois de umas 3 semanas adormecida. Olhei para todos os cantos para matar saudades e recordei desabafos e risadas com amigas… ali no meu canto. Sorri e revivi cada momento. Aquelas quatro paredes conhecem-me tão bem. Foi por lá que chorei de fúria, de raiva, de ódio e de revolta, foi por lá que sorri de gozo, de felicidade e de realização e… que hoje me vêem ali sozinha sem lágrimas e sem sorrisos como se o vazio me atormentasse a alma e me esvaziasse o rosto.
Estou simplesmente ali porque agora a minha casinha é habitada pelo silêncio e pela solidão. Encontro espaços vazios entre os meus perfumes e os brinquedos da Íris insistem em marcar presença em todas as divisões.
“Ao ponto que isto chegou!” – penso eu.
Insisto em encontrar uma razão lógica para as coisas mas confesso que muitas delas deixaram de fazer sentido, não pelo facto de me ter separado mas pelo facto de ter o meu mundo e de não o partilhar com ninguém. Deixei o meu casulo desamparado e embora existam pessoas que gostariam de ter a minha companhia, não me sinto suficientemente capaz de partilhar algo “tão meu” por meia dúzia de palavras amigas vindas de outra pessoa.
Penso no quanto desejava ter uma companhia no sofá num domingo chuvoso para ver um filme de terror, penso no quanto tenho saudades de cozinhar, penso em jogar às cartas ou ao trivial pursuit… mas depois reparo que não será só isso que me realiza… e desisto.
E os pormenores?! E as coisas mais banais?! Os abraços, os beijinhos de despedida, as idas às compras, os passeios até ao parque infantil e o ir buscar a Íris à escolinha?!
E o amor?!
Não será o amor a maior riqueza de uma casa?! Não será o amor que preenche estes espaços vazios?!
De que serve um sofá vazio, uma televisão desligada?! De que serve ter o meu espaço se não tenho junto de mim uma pessoa digna para o partilhar?!
E é esta a conclusão que tiro quando me refugio no meu canto da sala, sentada com os joelhos a tocarem-me no queixo. É assim que deixo cair uma lágrima de um sentimento que não conheço mas que mistura a solidão com a injustiça.
Consigo então sentir-me culpada e triste. Sim… sinto-me mesmo triste. Foi a tristeza de um dia ter desprezado as minhas coisas que hoje me fez sentir saudades delas. Foi a mágoa de ter desistido de acreditar no que um dia encheu a minha casa.
Quero uma família para esta casa. Quero uma pessoa que partilhe comigo a prateleira dos perfumes e me abrace quando me sinto sozinha. Quero amor… aquele amor sincero que vence barreiras, que nos faz partilhar as vitórias e as derrotas e que se recorda de mim mesmo quando eu não estou.
Essa pessoa existe... provaram-me que existe. E é neste momento que esboço um sorriso e me levanto.
Essa pessoa vive no meu coração e eu tenho de voltar a viver na minha casa.